22 dezembro, 2008


E que deus me livre dos livros
Que a fascinação não me fascine
Que o belo passe batido
E o comum se dilua
No liquidificador de merda
E ração adocicada.
E que deus me livre da lombra
Da imagem irreal
Do mantra do vento nas árvores

E que deus me livre da preguiça
Do cio e do ócio
Das fotografias de sebastião salgado

E que deus me livre das gargalhadas
Da sensação de chuva no rosto
Da brisa na madrugada

E que deus, em sua suprema bondade
Me livre dos livres
E aumente um elo
Na corrente que prende meu pé.

19 dezembro, 2008


Arranco a pedra
que me machuca o sonho.
Lapido. Não,
depois.
Agora durmo.
Sem pedras.
O outro dia é assustado por drummond de andrade.
Com suas pedras chatas no meio do caminho.
O que sei do sr. Drummond?
Que ele é uma estátua cagada por pombos no rio de janeiro.
Que tinha uma pedra em seu caminho esquisito.
Devia estar sem óculos.

18 dezembro, 2008


Máquinas fotográficas desesperadas
Nada preso
A foto tem que parecer um pedaço de nada preso
Senão, pra quê?

Eu, turista magrelo nessa cidade que nunca quero conhecer
Saia da minha cama sua cidade filha da puta
A apague a luz da rua quando sair
Como assim que é uma outra rua na rua?
Como assim que é uma outra mariposa na luz?
Como assim que o incandescente é fato?
Cidade... cidade
Cidade, preste atenção, a coca cola incendiada
Acaba de voar das mãos do garçom drogado.

13 dezembro, 2008


1
Devagar os tijolos subiam um a um. Se abstraísse, subiam sozinhos. Casas que se montam. Maria pintava seus quadros, de olhos vendados, enquanto os homens, capacetes brancos, montavam um edifício. O que é maria, senão um edifício de tintas, pincéis e capacetes – brancos pensamentos – que a montam? O que é maria enquanto ela monta um sorriso, um corpo, uma alma crepon e pêssego, lazúli alma. E o que é um edifício, senão um montão de marias e seus sonhos coloridos por dom e desejo?
2
E então moça do sobrenome esquisito, eu resolvi dar nome aos bois. O primeiro boi eu vou chamar de eurípedes, e todos os que vierem dele se chamarão “os filhos de eurípedes”. O segundo boi eu chamarei de dumará. Porque? Eu é que sei? Bois, quase que se auto-denominam, nominam, batizam-se pelos olhos. Então, moça do cabelo preto que eu nunca vi, resolvida a questão da nomeclatura bovina, vamos ao sentido exato: saudade. É certo, nunca te vi, e muito provavelmente nunca verei. Logo, essa saudade deve ser a ausência de um ser, que sei, vem de um planeta similar ao meu. Você estuda história, eu, conto histórias. Imagino histórias, que depois de imaginadas não sei se são reais. O que é real? O que sei, penso que sei, é que em minha história meu coração é um anfitrião onipresente. E, estando em todos os lugares, ri do teu riso. E enxuga a lágrima de alguém que chora em qualquer canto. Onipresente coração moça de cor indefinida, ta vendo lá? É ele. Com o espanador na mão. Tirando o pó que não deixa seu sorriso brilhar na madrugada de sábado.
3
Os segredos que ficam de costas, nas esquinas do olho que mira. Mirando o quê? O gole grande está dentro do copo. O copo está dentro do contexto. Um bode amarrado no quintal do pesadelo. A cobra cascavel sibilina saindo de dentro da cartola do mago dos aspargos. Dancem!!! Dancem!!! Manuelina olha pro céu e quer saber, por que quer, onde termina o céu. Manuelina quer saber qual é a cara de deus. Manuelina quer saber quem é que merece um sorriso. Manuelina sabe, que em algum lugar, em um jardim existe uma fruta do conhecimento. Ela viu na bíblia.
4
Aprendo o que cabe. Abro o que posso. Olho o que me é permitido. Acredito nas possibilidades. Sonho com coisas que não podem ser vistas.
5
Não aponte o dedo para o rosto do outro. Do número oito. Do que come em pé suas bolachas recheadas de nada. Calíope da silva morde morfologicamente o livro dos vampiros. Calíope da silva sabe que cada um dos que ela conhece tem um umbigo explosivo, só esperando uma chance. O jogador inverterado encosta-se no balcão. Liga o gravador e conta sua história pra ninguém. Uma bela história de frases curtas e de sentido nenhum. Ele diz: quando era pequeno um cachorro mordeu minha perna. Um dia desenhei uma vaca. Meu pai bebia uma bebida verde. Minha mãe chorava por um olho só. Calíope da silva se apaixona. Tira do cós da sua saia larga uma gilete platinum plus. Corta de orelha a orelha o pescoço do jogador. Ela nunca suportou ficar apaixonada.
6
Daqui debaixo da ponte vejo a lua. Penso nos olhos dos hipopótamos. Realmente não sei porque penso nos olhos dos hipopótamos. Talvez por causa dos seus olhos mesmo, que vi, assim, na discovery chanel. Eles estavam com sono. Abriam bocas enormes. Um deles parecia tim maia. Olho de novo a lua. Penso em tim maia. Nos hipopótamos. Peço a conta. Acho que bebi demais.

08 dezembro, 2008


Tem gente
Que é tão especial
Que parece que o mundo
Sempre dá um jeito de esperar
Por elas:
O show, começa mais tarde
O ônibus, aguarda mais dez minutos
A lua demora
A chuva cai, ralinha

03 dezembro, 2008


No olho dela
Tem uma lagoa
Na lagoa do olho dela
Tem uma gude
Amarronzada, acho eu
Um brilho, sei que tem
De gente que veio
Bem de longe
Em uma nave, talvez.

Chego em casa querendo rua
Paredes que se estreitam, como estreitas são
As petúnias na mão da defunta sem nome do jornal nacional
Entro então, como uma samambaia entra
Vaso adentro, sabendo sim, que o vaso é finito e raso
A única luz, uma luz, a porta da geladeira aberta
Frio, frio demais, frio pra caralho,
Quero um frio desses

Stéreos, ok! Graves e médios, ok!
O menestrel fala de rudeza, diz que tudo é solidão
Pessoas indo e vindo, mastigando ausências
Na trilha um ônibus um carro de mão uma guitarra
O sol de dezembro escondido atrás da água
Água de ausência, abrindo buracos assim, assados

Olho o olho da ave que não sei o nome, andina,
Bebo ayahuasca sem liturgia, só em minha viagem
Vejo o que não determino
Vampiros juntos no presépio de um deus menino abandonado
Miração urbana soft
A fogueira acesa, a fogueira,
Solitária na mágica de transformar toras em cinzas

02 dezembro, 2008


algumas coisas
deveriam sumir antes que as víssemos
algumas coisas
deveriam nunca acontecer
algumas coisas
doem como se nunca mais fossem parar
algumas coisas
não deveriam ser sonhadas
algumas pessoas
deveriam
prestar
atenção
nas placas

01 dezembro, 2008


Algumas coisas só acontecem na madrugada de domingo pra segunda. É uma hora mágica, de começar coisas. De abrir com as duas mãos a máquina do relógio e ordenar: devagar! Ela balançou suas asas na mesa. Sorriu com os olhos. Convida? Convida não. Diz com os olhos: preste atenção! Demora pra chegar? Demora não. Chega na hora certa. Intima. Mostra o olho. Mergulha nos olhos. Depois beija? Beija não. Se deixa beijar. De leve. Gosto bom de mulher. Da fada. De fêmea. Diz um monte com o corpo. E fala pouco. Promete? Promete nada. É assim: cada vez, a primeira vez. De uma hora pra outra diz: ta na hora de dormir. E levitando, árvore que anda, sai da minha vista. Entra em minha vida. Passeia descalça em cima do meu coração. Ê pagu ê.

28 novembro, 2008


Eu tenho dezenas de ânforas
Sabia?
Em cada uma delas
Guardada do tempo,
Um bem querer.
Ali, naqueles papéis,
Guardo poemas de um tempo
Em que o tempo era
A minha preocupação nenhuma.
Naquela gaiola? Tejuro
Nunca morou nenhum passarinho.
De vez em quando remexo tudo,
Mas dói...
E o de vez em quando tem de ser só
De vez em quando.
Em uma das ânforas, dia desses,
Descobri vinte e nove interrogações.
Subi no último andar
E espatifei-as na calçada.
Não agüentava mais me responder:
Porque não fui?
Porque não comi?
Porque não aprendi?
Eu sei das perguntas, barulhentas
O que eu não sei,
É como silenciá-las.

25 novembro, 2008


Uma noite uma mulher me chamou como se chama um homem. Percebi? Senti. Sem que ela falasse, seus olhos queimaram meus braços, pernas. Quis me entender. Ser homem. Tomar atitude. Não entendi nada. Bateu medo. O pau dando sinal de vida dentro da minha velha calça jeans sem cueca. Pensei: ela tem os olhos de sangue. Ela tem os olhos de quem comete um crime. Ela tem os olhos... ela tem os olhos mais bonitos que eu já vi na porra da minha vida. O copo tremia na minha mão. Olhava. E quando ela olhava, firme, certeiro, eu desviava os olhos. Como uma presa indefesa. Devagar. Devagar ela veio. Lenta como um bicho que vai pegar um bicho menor. – eu sei teu nome. Sei onde você mora. Sei o nome da bebida que você tá bebendo. Só não sei quando é que você vai jogar esse cigarro fora pra eu te dar uma chupada na boca. Medo. Puta que pariu. Ela me assustou de verdade. Joguei o cigarro fora. Sem charme. Rápido demais talvez. Ela se encostou em mim. Não, não é verdade. Ela quase entrou em mim com roupa e tudo. Não escutei mais nada. Tinha alguém tocando no palco? Tinha alguém perto? Ela se encostava mais. Imaginei que nunca mais ia descolar dela. Não queria. Não podia. Se ela saísse naquele momento acho que morreria. Tinha um cheiro doçe. Não sei o nome do perfume. Mas ainda hoje, trinta e tantos anos depois, se sinto alguém passando com esse cheiro na rua, paro. É ela. O fantasma dela. Cheguei em casa naquela noite com um gosto que superava a falta de gosto de todo o resto. Namoramos duarante um ano. E todos os dias, era como a primeira vez. Um entrando no outro. Depois do medo da primeira vez, o tezão absoluto. O vício. O gosto bom da boceta dela na minha boca. O riso sem motivo aparente.Os olhos cor de jabuticaba tatuados nas minhas retinas. Saias coloridas. Jeans desbotados. Sandálias de couro amarradas nas pernas. O cheiro... o cheiro... um dia ela veio se despedir. Me comeu como quem sabe que vai passar fome depois. Me mordeu. Me arranhou. Lambeu o sangue. Chorou. No outro dia eu olhei o céu de manhã e rezei: - por favor, eu nunca te peço nada. Não anoiteça! Não anoiteça, pelo amor de deus. Quando a noite chegou eu tomei um porre, e chorei. Como os guerreiros vencidos. Como os países que são invadidos. Como os bichos. Ela me ensinou a ser bicho. E depois, me soltou na cidade. Um menino com a dor de um homem. O cheiro... o cheiro...

18 novembro, 2008

SHOW DE ROCK E LITERATURA NO PÁTIO DO ICBA

A banda de punk rock Pastel De Miolos (no seu primeiro show acústico em 14 anos de trajetória), o poeta Lupeu Lacerda (com poemas de seu primeiro livro "Entre o alho e o sal") e o quarteto de escritores CORTE (Gustavo Rios, Sandro Ornellas, Katherine Funke, Lima Trindade e Wladimir Cazé) participam do projeto Remix-se, no sábado, 22 de novembro, no Pátio do ICBA (Corredor da Vitória). No show, a energia e a sonoridade pesada da Pastel De Miolos se somam à modernidade urbana da literatura baiana contemporânea.



Lupeu Lacerda vem de Juazeiro (BA), onde mora, para seu primeiro recital em Salvador, a convite do CORTE. Ele fará uma leitura improvisada, com acompanhamento musical da Pastel De Miolos, e o CORTE fará intervenções com trechos de seus livros, durante a execução de algumas músicas pela banda. Gustavo Rios lerá seu poema "Ilusões", musicado pela Pastel De Miolos (que fará parte do próximo CD da banda), Lima Trindade lerá um trecho de seu conto "Queen Mary II", Sandro Ornellas lerá seu poema "Serpentário" (ao som de "Riders on the storm", do Doors) e Cazé lerá um fragmento de um texto inédito.



A Pastel De Miolos é um power trio (guitarra, baixo e bateria, respectivamente Allisson Lima, Alex Costa e Wilson Santana) com incontáveis shows na região metropolitana de Salvador, pelo interior, em outros estados e convites para Warped Tour na California (USA). "Tocamos juntos há tantos anos e nunca tínhamos feito um show com violão no lugar da guitarra", diz Alisson, que, no recital de literatura e rock, vai trocar a guitarra por um violão turbinado por efeitos de pedal. "Quando uma banda coloca elementos novos, muda tudo, o processo criativo parece que se abre", repara Alisson. Além de músicas próprias da Pastel De Miolos, a platéia ouvirá clássicos do punk nacional – "Soldados" (Legião Urbana), "Até quando" (Plebe Rude), "Astronautas" (Replicantes),"Que Vergonha" (Olho Seco), “Fênix” (Declinium) – e estrangeiro ("Brand new Cadillac" e "Guns of Brixton", do Clash).



A discotecagem ficará por conta do Dj CHICO CASTRO Jr.



FICHA TÉCNICA:



CORTE: Lupeu Lacerda, Sandro Ornellas e Wladimir Cazé (poetas) Katherine Funke, Lima Trindade e Gustavo Rios (contistas).



Pastel De Miolos: Alex Costa (baixo e voz), Alisson Lima (guitarra e voz) e Wilson Santana (bateria).



Discotecagem: Dj CHICO CASTRO Jr.



No TELÃO: Exibição do DVD “Resistir...” da banda PASTEL DE MIOLOS



SERVIÇO:



Onde: ICBA / Instituto Goethe, Avenida Corredor da Vitória, 1.809, Salvador (BA)

Quando: 22 de novembro, às 18h

Quanto: Entrada franca

Realização: Projeto Remix-se

E-mail: verbo21@gmail.com

Site: www.sequicosacro.blogspot.com

www.myspace.com/pasteldemiolos
www.remix.art.br

11 novembro, 2008


Falo uma língua
Arrevezada
Herdada da rua meio assim
Aprendi a contar usando os dedos
Os medos
Enquanto esperava
Sempre esperei
Daí que aprendi
A língua que pede
Comida
Lombra
Perdão
Arrevezada língua de deus
Na babel
Maior que qualquer escrita

10 novembro, 2008


O domingo é um dia cruel. O sol bota as unhas. A mão inteira no chão. Acho que resolveu foder com tudo. Penso em me fechar no quarto. Me sentir camisa. Me pendurar em um cabide e dormir. Morrer. Tudo dentro do guarda roupa é morto. Opaco. Cheira a naftalina e lembrança. O sol. Vai embora quando? A noite vai chegar quente. Sem alma. Sem vento. Acendo o cigarro número quarenta e quatro. Solto a fumaça número noventa e nove. Na fumaça desenho uma nuvem. Uma chuva. Talvez uma chuva. A fumaça olhada. Dissecada. O cadáver de um vício companheiro da solidão em tecnicolor. Não quero olhar da janela. A janela não existe. A janela existe. E tem um mundo vasto demais visto pela janela. Sei da impossibilidade. Não olho pela janela. De certa forma sou um fugitivo. Um exilado do mundo. Fazendo parte, não faço. Não faço nada. Não nado. O sol. Trégua nenhuma. Nada de mão passando nas costas. Nada de carícias fraudulentas e de mão única. Sem rir. Sem falar. Ordem. Seu lugar. O sol. O termômetro enlouqueceu. Quarenta e cinco. Meu personagem esqueceu a fala. A deixa. O ponto. Meu personagem não sabe que perdeu. Ou o que perdeu. Não estou bem certo do que digo. Não quero ser roupa. Quero ser a colcha jogada de qualquer jeito sobre a cama largada no quarto de qualquer jeito. O sol. Puta que o pariu. O sol. Penso nu. Penso em sair nu. Impraticável. Onde colocar cigarros, celular, carteira, moedas, amuletos, patuás, flagrantes? Falar pouco. Falar nada. Seduzir pelo silêncio. Tornar o silêncio tão denso que incomode os ouvidos. Café. Traz café frio. Gelado. Uma cerveja. Duas. Um monte. Gastar pouca energia. Levantar o braço devagar. Coçar os ovos. Passar o cigarro pra outra mão. Coçar o sovaco. Uma punheta talvez? Impraticável. Calor retado. O sol. O suor pegajoso. Um nojo sereno de mim. Da humanidade. Da água morna. Gritar. Gritar não. Gasta muita energia. Não quero mais palavras. Uma de três letras está me matando. Com mais lentidão. Como se tortura fosse. O sol. Sol. Sol. Puta que pariu.

31 outubro, 2008


O celular me liga no mundo e sei, continuo desligado. detesto isso de ser achado a qualquer hora. Gostava quando os telefones viviam presos. Iguais a cachorros ferozes. Presos em suas cordinhas enroladinhas. A gente via eles lá, nos cantos das paredes, cobertos com pequenas toalhas de crochê, ou as vezes, presos também com pequenos cadeados. Um dia eles se soltaram. Pularam das paredes para os cintos. Depois para as bolsas, os bolsos. Um dia, vão andar sozinhos. Falar entre si. Planejar a destruição de todos os humanos.

26 outubro, 2008


Minha menina jesus que nasce quando quer
Minha menina jesus criadora do mundo e da polícia
Minha menina jesus armada até os dentes como se preciso fosse
Minha menina jesus criada feito bicho entre os bichos
Minha menina jesus fumando maconha meio dia em ponto
Minha menina jesus rindo dos super-homens
Minha menina jesus amaldiçoando os violões de doze cordas
Minha menina jesus de mini-saia vomitando fliperamas
Minha menina jesus apalpando os ovos de qualquer presidente
Minha menina jesus dizendo que não tem nada a ver com isso
Valei-me
Valei-nos
nus

19 outubro, 2008


Procuro aurora. Onde é que encontrarei a louca e bêbada boreal? De cima da bicicleta vi quando o carro veio em alta velocidade. Era lógico que ele não ia conseguir fazer a curva. O carro bateu na guia da calçada. Por um momento, era como se não houvesse gravidade. Ele girou no ar por alguns segundos, e pousou. Caiu. Pedaços misturados de ferro, velocidade e gente. Um ipod amarrado nas orelhas soltas. Sem dono. Pego. Escuto: “esse é o ninho do passarinho, que já nasce voando sem asas”. Casa das máquinas. Cinco e meia da manhã. Boreal. O acidente decreta o feriado. Ontem a noite aurora me disse, com raiva: “não traduza minhas palavras como se fossem canções desses fudidos norte-americanos. Pelo menos uma vez, diga a verdade”. Não ligo. Puxo meu revólver língua e disparo seis mentiras metálicas e super modernas. Boreal retruca: “você sôa falso. Como um tenor castrado. Como a voz dos desenhos animados. Você é um... Mickey. Não. Você é um pateta”. Rio. Gosto de rir quando ela explode seus molotovs arquétipos. Ela pede ao garçom um copo de silêncio e o saboreia com vagar. Eu, gargarejo cacos de anoitecer. Subo na bicicleta. Procuro nos bares que ainda estão abertos. Aurora. Aurora. Lá está ela. Jogando pedaços de sol em minha janela mal lavada. Penso em contar do acidente. Da música. “essa é a semente da nova terra, essa é a bomba que acaba com a guerra”. Não preciso. Ela vai embora quando me vê. Grito: os cegos, coitados! Não sabem das borboletas. Nem sonham arco íris. Boreal...boreal...

17 outubro, 2008


dois
é duas vezes 365
dois
é o começo do três
dois anos:
poesia, personagens,
o subsolo de um romance
amigos
sexo
umas droguitas bacaninhas
um monte de palavras escritas,
e porque não?
um dia de tomar um porre.
séquiço sacro, na rede, há dois anos.
e haja preguiça...

15 outubro, 2008


Eu até poderia
Te dar o troco.
Eu até poderia
Te engolir aos poucos.
Nas meias medidas
Te meço:
Esqueço.

14 outubro, 2008


sim
preciso realmente perder o juizo
procurar um fundo de mar
no fundo dos olhos
de aquario
da mulher de peixes
vixe
que nada é eterno
vixe
que tudo desmorona
vixe
que tudo murmureja
e o sol paciente apodreçe
o gato do mato
atropelado bestamente
na br veloz

12 outubro, 2008


Quando me apaixonei pela primeira vez
Tinha duzentas espinhas no rosto
E um coração que me orientava desorientando
Ela assistia um filme no cine eldorado
Fazia lindas bolas de chicletes
E apertou devagarinho minha mão.
Quando me apaixonei pela segunda vez
Achava que era forte e inquebrável
E meu coração ficava na dele, só na batida
Ela tinha uma camisa sandinista
Granadas palavras, beijos ardentes
E apertava a minha mão como um companheiro
Na terceira vez que me apaixonei
Meus olhos já estavam gastos
Meu coração sussurrava: tenta, tenta porra!
Ela tinha um Hollywood trançado entres os dedos
Me comia com olhos abertos
E sua mão
Nem acenou pra mim na despedida

coneueraminino


Sinhamariquinhacadêminhaboneca conversa maluca de procurar boneca uma hora dessas da manhã. Tisconjuro. Sinhamariquinhacadê. Conversa sem eira nem beira de estrada que a gente não sabe pra onde vai. Sinhámariquinha onde fica o final do arco íris. O final do arco íris todo mundo sabe que fica no começo. Sinhá. Sinhá. Sinhá que música é essa que invade tudo como se água fosse. Aguafôsse? Aguafôsse nem inxiste. Coisa feia fazê pouco dos outros. Coisa feia chama os outros de sinhá. Coisa feia não saber o que se vai fazer todo dia. Coisa feia. Sinhá mariqui. Cala a boca abestado. Respeite as horas do dia. Te os passarinho cala a boca nessa hora. Te o rádio fica mais brando. Vou inté soltar os passarinho tudo. Hoje, se não amanhã. Sinhá. Sinhá. Sinhá. Omi seu minino. Vai pra puta que pariu.

01 outubro, 2008


Arimatéia fazia santos na rua todos os santos. Na cidade dos santos de Arimatéia tem um bar em cada esquina. E dentro de cada bar tem um demônio com a cara da Sandra de Sá. A música que toca na rua de todos os santos onde Arimatéia fabrica os seus é fora de ritmo. Benditos com pedal de distorção. Ladainhas louvando porcas prenhas. Arimatéia não nota a distorção. Sai na janela e olha o defunto que segue em seu distinto paletó de madeira ornado. O morto é pobre. Onde vão enterrar? A música volta. São Sebastião sai da madeira bruta nas mãos de Arimatéia. Pensa em fazer o padre da serra. Enjoou do padre da serra. Faz um anjo. Bota uma espingarda na mão dele. Vira cangaceiro. Anjo. Arimatéia fica com vontade de ir no bar. Ver o cão Sandra Sá. Olhos coloridos. Desiste. Acende um baseado. Vai ouvir a hora da graça.

19 setembro, 2008


Agenor acordou com uma voz estranha em seu ouvido. Achava que era uma voz de criança. Ou de velha, perto de morrer? Pensou que ainda estava dormindo. Não. Estava acordado. A televisão estava ligada. Um pastor com sorriso número trinta abençoava os fodidos da segunda feira. O jornal entrou pela fresta da porta. O escroto do garoto não se preocupava se aquela merda entrava amassado. O menino tinha pressa. A cidade tem pressa sempre. Agenor levantou devagar. Um barulho irritante vinha do banheiro. A pia. Ligada a noite inteira. Que merda. Bateu um remorso, mas depois passou. Lembrou do aqüífero guarani. Ainda ia ter muita água pros fodidos do país depois que ele se fosse. Decidiu não desligar a torneira. Nunca mais. E que se fodessem para todo o sempre os ecologistas de plantão. Pena não ter um gato pra chutar. Pensou em tomar banho. Depois desistiu. Pra quê? Não ia tomar banho. Nem sedativos. Nem fazer a barba. Abriu a porta pra varandinha ridícula de seu apartamento. Olhou a rua. O esgoto continuava estourado. A filha de dona Guiomar estava chegando. Ia tomar umas porradas. Decidiu ver o show. O tapa fez Cidinha cair. Dona Guiomar tem a mão pesada. Cidinha sempre apanha na segunda feira. Acho que acostumou. O chute pegou na boca. Vão separar. – deixa a vadia apanhar! Eles nunca deixam. Olhou de relance o jornal. Nada de novo. Os mesmos roubos. As mesmas mentiras. A mesma desesperança. E o gado segue manso. Cada um pro seu curral. – vai trabalhar não Agenor? Essa moleza vai acabar! Decidiu que não tinha escutado. Decidiu que não era Agenor. Decidiu que era um presidente exilado de uma ilha distante e sem nome. Decidiu que sempre tinha sido um preso político em prisão domiciliar. Decidiu que era um filho da puta abandonado em uma unidade de menores infratores. Lembrou de um menino. Ele? Um personagem de um livro? Filme? Ele? Ele. Com uma baladeira na mão. Uma lagartixa sem cabeça estremecendo na parede. Trocou de roupa. Botou uma bermuda larga. Uma camiseta branca. Procurou. Amassou a antena interna da televisão. Fez um V. amarrou pedaços de elástico. Improvisou uma baladeira. Disse, pra ninguém: - vou sair. Não me espere. Vou caçar lagartixas.

10 setembro, 2008

lima trindade me deu de presente a oportunidade de falar um monte em sua revista cibernética "verbo 21". a quem interessar possa, vão lá, leiam (a entrevista e a revista, que é do caralho).

www.verbo21.com.br

O MUNDO NÃO ACABA MINHA QUERIDA
Acredite. Por mais que os caras tentem, existe uma resistência. Um não morrer, ta entendendo? Tem hora que não entendo. Mas sei, assim como quem sabe andar. Assim como quem trepa pela primeira vez. Então, não se culpe. Pode jogar o papel do bom-bom na rua. Com o vento, vai parecer que ele ta dançando.

DECIDO TRATAR MAL ALGUMAS PESSOAS
Porque isso me diverte talvez. Porque é mais fácil ser assim. Porque quando leio Sade não acho o estranhamento adolescente. Porque a porra do sinal sempre fecha quando estou apressado. porque minha grana acaba na sexta. Porque não sei jogar bola. Porque tem dia que a coisa mais interessante a fazer, é acabar com o dia de alguém.

AÍ, QUANDO O OLHO ABRE
Dá pra acreditar que o inferno é aqui. Sinta o cheiro. Podre. É um cara. A barba cheia e fétida. A roupa de sabe-se lá quantos dias. O ônibus lotado. Dezenas de caras tristes. A polícia passa arregaçando. Vão matar alguém. A fila do banco serpenteia na calçada. Os camelôs vendem os últimos lançamentos em filmes. O traficante sorri quando olha os cabeludos. Fecho os olhos. O inferno é aqui.

02 setembro, 2008


Cometo
Indiscreto que sou
Ardo em frente ao fogo
Meto
Dedos, pau, língua
A conversa sem verso
Os pés pelas mãos
Cometo
Erros novos de eros
Sopro as cinzas do meu pai
De cima do meu pau
Rápido
Rápido
Cometo
Cometa.

01 setembro, 2008

dois poemas para morder


Eu acredito na verdade
Que baila no vento verde que sopra teus cabelos lavados com coisa nenhuma
Eu como o verde salada no meu prato lápide
E relincho como só relincham os homens sem nome e sem pátria
Eu acredito na verdade
Assim como acredito no aboio sereno das mulheres que pastoreiam estrelas
2
Aqui sento minha bunda
Olhando no vídeo nosso de cada dia
Oro de ora em hora pro santo pagão da hora
Aqui sento minha bunda
Súdito fiel esperando minha hóstia de nada
Pra seguir minha vida vídeo
De nada.

29 agosto, 2008


Quem escreve na certa não é para esperar o messias
Quem escreve quer o anjo degolador
Quem escreve quer a ciência
De nunca saber o suficiente
De nunca escrever o suficiente
De nunca saber qual é o limite do suficiente
Quem escreve sabe que é medíocre na sua medida
Quem escreve nunca vai escrever melhor
Quem escreve não quer escrever melhor
Porque na verdade, ninguém agüenta seguir sozinho
Porque na verdade, melhor ser estrela e ficar
Do que ser meteoro e seguir
Quem escreve se afasta
Quem escreve diz, que quando escreve, se aproxima
Quem escreve pensa, que é a linha que segura a pipa
Mas a pipa não quer a linha, quer o céu
Mas a pipa não quer a pipa, quer ser nuvem
Mas a pipa não quer a nuvem, quer vir no vento
Quem escreve pisa na água da chuva
Quem escreve sonha com uma jerusalém nunca vista, abatida a tiros
Quem escreve, odeia quase todo mundo
E ama, seu reflexo colorido
Nas prateleiras dos supermercado.

27 agosto, 2008


Então aos quarenta e três não sei de que tempo entra em campo uma dor filha da puta. Estômago. Lado direito. Penso em meu pai. Uma dor dessas. Ele se apoiou no ombro de alguém que o levou até a ambulância. Ele não voltou. Ando pela sala. Acuado. A dor silenciosa que grita em meus ouvidos. Sento. Levanto. Deito. Acendo um cigarro. Jogo fora pela metade. Acendo outro. Mudo o canal. Mudo o canal. Mudo o canal. Mudocanalmudocanalmudocanal. Nada na porra da tela que adormeça essa dor. Pego o telefone. São duas da manhã. Quem acordo na terça? Desligado. Desligado. Desligado. A dor ligada. Vou no banheiro. Enfio o dedo goela a dentro. Quero vomitar a dor. Continua lá. Belisca. Unhas pontudas como as de uma mulher na noite de sábado. Unhas vermelhas? A dor. Caralho. Que puta dor. Abro a porta do armário. Quarenta gotas de paregórico. Vomito ópio. Mais quarenta. Vomito de novo. A dor me apavora agora. Não mais a mulher de sábado. Não mais a professora simpática de voz macia e suor perfumado. Agora a velha. A escrota dor. Olho as caixas de remédio. Nenhuma bula mágica que cesse. Penso em rezas. Alquimias de quando a serra me trazia a serena idade. Dor. Penso nas cervejas. Excesso, talvez? A dama branca? A dor não quer pensamentos. Penso no tempo. Nas seis balas de revolver do tempo. Quantas atirei? Quantas ainda tenho no bolso do colete? Eu não tenho colete. Dor. Dor. Dor. O amigo do trabalho aparece. Me pega nos braços. Sem força. Choro na cabine do carro. Urgência de um hospital nojento no centro da cidade. Bebe? Sim. Fuma? Sim. Drogas? Sim. Lacônico médico. Com sono talvez. Diz que tenho de parar tudo. Pergunto: e a dor? Vai passar, por enquanto. Ele diz. Lacônico. Sono talvez. Beat demais. Ainda não tenho obra pra ser póstumo. Saio as quatro da manhã. Sem dor. Dopado. Sei agora o meu limite de dor. Sei nada. Daqui, ninguém sai vivo.

19 agosto, 2008


Agosto
Um gosto de fruta velha, pendurada do texto do verso de um velho maluco cantando uma triste cantiga nas ruas enlameadas de potengi.
Agosto
Um rabisco de uma história em quadrinho de um tempo em que os índios comiam os inimigos com maionese rançosa produzida nas esquinas de nova Iorque
Agosto
Uma folha de parreira descendo espontânea da boceta de Eva em uma performance neo punk expressionista sob a luz ilusionista dos arabescos do cocainômano Sigmund Freud
Agosto
Cachorros loucos passeando sob o luar tragicômico de Santana do cariri
Agosto
Uns nascem
Outros renascem
Uns
Se rebelam.

15 agosto, 2008


Narani serve suco de nada em jarras escuras. Fala de sorvetes. Coisas geladas fabricadas no país dos eunucos. Dão medo. Dão sede. Dão vontade. Narani fala que a estrada é lenda. E que atalhos são mentiras. Diz: existe lua? Não existe. Aquilo é o olho único do unicórnio que criou isso tudo. Pergunta: tem dinheiro? Tem? Estende a toalha de crochê na calçada matizada. Castiçais de plástico. Incensos. Cabeças de boneca. Velas tristes. Apagadas. Narani diz da mágica das velas apagadas. Do medo de acende-las. Fala de um jantar macrobiótico. De sua infância primeira. De masturbação e pecados deliciosos. Mas isso é apenas um jantar. Narani sabe. Talvez o último. Um fio de baba escorre no seu queixo antigo e belo. Narani não tem idade. Conta que comeu coisas que não existem mais. Que bebeu refrigerantes sumidos nos baús da memória coletiva. A vida é só um dos tabletes doces no tabuleiro de Narani. Narani diz que a canção que ela mais gostou na sua vida era uma propaganda de chicletes. Mas ela não lembra a letra. Cantarola: nã na nana, nara rara ra. Ninguém sabe. Ninguém conhece. Narani diz que batizou todos os seus dentes: quando eles caiam, ela os batizava e enterrava no jardim. Lembra de todos. Mas não quer mais falar nisso. Ela nos conta que sempre detestou os arranha céus. Talvez pelo contexto da palavra. Ela não imagina alguém arranhando o céu. – isso tem conseqüência! Conta que sempre gostou de insetos. Que eles foram suas companhias mais fiéis. Sempre gostou das borboletas kamikazes. Voando ensandecidas para a luz. Pela luz. Ela diz que a gente é igualzinho. Que se fode. Mas bate a cabeça na direção da luz. Diz que um dia amou um guarda noturno. Pelo som do apito. Um dia o guarda mudou. Conta que notou. Pelo som do apito. Chorou. Depois casou com um palhaço de circo. Gostava de rir. O palhaço um dia sumiu. Deixou um estojo de maquiagem. Meia carteira de cigarros. Um pé de meia azul com bolinhas amarelas. Narani diz que só notou dois anos depois. Quando morreu pela terceira vez.

Zé de diadora escuta vozes que ele não sabe de onde. Diz ele que as vezes são cantigas, bem bonitas cantigas. De outras vezes são ordens. Gritos. Músicas estranhas. Cantos de passarinhos. Pergunto se ele escuta a gente. Falando com ele também. Diz que escuta. Que é como o botão de sintonia de um rádio. Só escuta uma coisa de cada vez. As vezes ele recita estrofes inteiras de camões. Outras vezes – em filas de banco – ele fala em línguas estranhas. Dona antonina diz que ele fala alemão, javanês, carioca. Dona antonina sabe. Dona antonina lê mão e vê visage. Zé de diadora vive das graças de deus. Trabalhar mesmo, nunca. De vez um quando faz um mandado. De vez em quando não faz. Ta sem vontade. Com calundu. Dona antonina disse a minha mãe que isso é coisa de homi donzelo. Que as coisas lá dele, subiram tudo pra cabeça.

11 agosto, 2008


no dia dos pais
pensei em jim
cantando the end

The end (tradução)
The Doors
Composição: John Densmore / Robbie Krieger / Ray Manzarek / Jim Morrison

O Fim

Este é o fim
Belo amigo
Este é o fim
Meu único amigo, o fim
Dos nossos elaborados planos, o fim
De tudo que permanece, o fim
Sem salvação ou surpresa, o fim
Eu nunca olharei em seus olhos...de novo
Voce pode imaginar o que será?
Tão sem limites e livre
Precisando desesperadamente...de alguma...mão de estranho
Numa terra desesperada?

Perdido numa romana...selva de dor
E todas as crianças estão loucas
Todas as crianças estão loucas
Esperando a chuva de verão, sim
Tem perigo no extremo da cidade
Passeie pela estrada do rei, bem
Cenas estranhas dentro da mina de ouro
Passeie pela estrada do este, bem
Passeie pela serpente, passeie pela serpente
Para o lago, o antigo lago, bem
A serpente é longa, sete milhas
Passeie pela serpenteÂ… Ela é velha e sua pele é gelada
O oeste é o melhor
O oeste é o melhor
Vá lá, e nós faremos o resto
O ônibus azul está nos chamando
O ônibus azul está nos chamando
Motorista, aonde está nos levando?

O matador acordou antes do amanhecer, ele pôs suas botas
Ele tirou uma foto da antiga galeria
E andou pelo corredor
Entrou no quarto em que sua irmã vivia, e...então ele
Pagou a visita a seu irmão, e então ele
Ele andou pelo corredor, e
E ele veio até a porta...e ele olhou para dentro
"Pai?", "Sim filho?", "Eu quero te matar."
"Mãe...Eu quero...te foder."

Venha bem, tente conosco (3x)
E me encontre atrás do ônibus azul
Fazendo um foguete azul, No ônibus azul
Fazendo um rock triste, vamos, sim
Matar, matar, matar, matar, matar, matar

Este é o fim, belo amigo
Este é o fim, meu único amigo, o fim
Dói te libertar
Mas você nunca vai me seguir
O fim da gargalhada e das mentiras suaves
O fim das noites que tentávamos morrer
Este é o fim

09 agosto, 2008

para iza greff


Meu Carnaval



(Guga Borba)

D D4 D G
Vou deixar a lareira acesa
A D D4 D D4
e sobre a mesa, o jantar.
D D4 D G
Vou levar a marmita tão boa
A D D9 D D9 Bm
que a própria patroa me faz.

E G
Quando digo as coisas tão lindas
D D9 D D9 Bm
Não te faz mal,
E G
Quando digo que sempre fascina
D D7
Meu carnaval.

G
Amanhã vai se abrir
A D D4 D D4
Em todo o céu carmesim,
G
A "lerdeira" certeira
A D D4 D D4
Que sempre certeza se faz
G A
Vou levar a bagagem mais cedo
D D9 D D9 Bm
Pra não te acordar

E G
Quando digo as coisas tão lindas
D D9 D D9 Bm
Não te faz mal,
E G
Quando digo que sempre fascina
D G D G
Meu carnaval
D G D G
Meu carnaval
D G D G
Meu carnaval
D D7
Meu carnaval

G
Amanhã vai se abrir
A D D4 D D4
Em todo o céu carmesim,
G
A "lerdeira" certeira
A D D4 D D4
Que sempre certeza se faz
G A
Vou levar a bagagem mais cedo
D D9 D D9 Bm
Pra não te acordar

E G
Quando digo as coisas tão lindas
D D9 D D9 Bm
Não te faz mal,
E G
Quando digo que sempre fascina
D Bm
Meu carnaval

(Nessa parte soe o acorde bem baixinho)

E G
Quando digo as coisas tão lindas
D Bm
Não te faz mal,
E G
Quando digo que sempre alucina
D
Meu carnaval
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06 agosto, 2008

JURUBEBA LEÃO DO NORTE


(jurubeba) – por mim nem tinha curva
(leão do norte) – por mim a água seria sempre turva

A CENA SE PASSA DENTRO DE UMA CAIXA DE VIDRO SUSPENSA POR UMA CORRENTE COM UM DOS ELOS QUASE PARTIDO.

(jurubeba) – a água é doce. A água é sempre doce.
(leão do norte) – e a porra da mágoa? A porra da mágoa é flor de lodo. É foto amarelada.
(jurubeba) – cala a boca caralho!!! Foto amarelada, fôda-se com suas fotos amareladas.

UM MICO LEÃO DOURADO SALTA DA SAMAMBAIA DE PLÁSTICO E LIGA O RÁDIO. ONDAS MÉDIAS.

(leão do norte) – preciso pagar carnês. Contas. Boletos. Jogar na loteria.
(jurubeba) – preciso que alguém me diga: - ria!
(leão do norte) por quê?
(jurubeba) porque entre eu e você tem uma noite de ônibus. Duas horas de avião. Um macarrão que detesto. Um livro de Carlos Drumonnd de Andrade que você me disse, um dia, que nunca, por motivos óbvios, vai ler.
(leão do norte) um dia, quando tudo perder a importância empírica. Um dia, quando a televisão ficar o dia todo desligada. Um dia quando todas as contas virarem piadas. Um dia quando todos os carros ficarem estacionados. Aí, e só aí, eu vou olhar uma flor até que ela se abra inteira. Aí, e só aí, eu vou pegar um desses livros com títulos estranhos e lê-lo do começo até o final. Antes disso, pra quê?

QUATRO OPERÁRIOS DA CONSTRUÇÃO CIVIL PARAM EM FRENTE A CAIXA DE VIDRO E COMEÇAM A FAZER UM STRIPTEASE. UM DELES IMITA MADONNA. OS OUTROS SE IMITAM. UM VELHO ÍNDIO ACENDE VELAS DE TAMANHOS DIFERENTES. UMA VELHA ÍNDIA ACENDE UM CACHIMBO. UMA GAROTA ÍNDIA CANTA UMA LITANIA XAMÂNICA MONOCÓRDICA E IDIOTA.

(jurubeba) você quer ser uma mona lisa, só por causa do sorriso né? Você quer morder a orelha, como um vangogh mal humorado e sem graça né? Você quer êxtase, mas não quer terror né?
(leão do norte) eu vou re-encarnar em um urso de pelúcia. Eu vou ser um urso tecno. Eu ainda vou ter os olhos moles feitos os de pagu. Eu vou armar pra você uma arapuca de seringas beat polifônicas.
(jurubeba) a vida ta beleza man. Sem dores esquisitas. O paregórico segurando a cólica e a cerveja iluminando a lua plena. Então, o que dá pra lhe dizer agora é que sua bunda não faz diferença alguma. É que sua alma não vale um vale pro inferno. É que sua falsa cultura tem um ácido que corrói a paciência. Mas a vida ta beleza man. Ta beleza.

A CENA É ILUMINADA POR OITENTA E CINCO LANTERNAS JAPONESAS. DEZOITO MENINOS NÚS ENCENAM A DANÇA DA CHUVA PORTANDO MARTELOS. ELES AVANÇAM PRA CAIXA DE VIDRO. DEZOITO CINEASTAS CONVIDADOS REGISTRAM A CENA.

(leão do norte) aquele menino ta contando estrelas?
(jurubeba) é que ele acabou de assistir E.T. do Spielberg.

04 agosto, 2008


O leite derramado
No fogão de lenha
O sangue coalhado
No chão
Do boi
Morto.

02 agosto, 2008


O beato zuílio subiu os degraus da igreja matriz e gritou possesso: “estão tocando fogo nas beiradas do céu”. Contam que aquele um, o cego, era a encarnação de lampião truviscado com corisco. Onório correu nu depois de pular a janela de expedito leiteiro. O beato zuílio dizia: “é preciso imolar um cordeiro!” onório caiu aos pés do beato. Em suas costas, o cabo de uma faca de dezoito polegadas cravadas até o talo. Aquele um, cego, se benzeu. O resto do povo correu. O beato olhava em silêncio. Um silêncio de fim de tarde, quando parece de verdade, que tão tocando fogo nas beiradas do céu.

31 julho, 2008


Dividi com Miguel uma bolacha creme cracker com doce de goiaba quando tínhamos doze anos. O povo dizia de Miguel: - é fraco da mente, tadinho. Ele não ligava. Ou fingia bem. Quando a gente vinha da escola ele dizia: - de noite eu não sou doido. Doido de noite? Tem quem seja. No dia da chuva eu o vi no meio do campo de futebol. Sozinho. Me disse que estava conversando com as coisas. E que na chuva as coisas falam com mais clareza. Miguel tem o dom de entrar nos lugares e não ser notado. Tem as roupas e sapatos cheios de marcas, assim como seus joelhos. Caía muito meu amigo Miguel. Com ou sem ajuda. Não sei por que lembro de Miguel quando estou sozinho. Mas lembro. Talvez por ter sentido nele o animal da solidão que me apavora hoje. Dia desses nos encontramos. Ele me abraçou. Lembrou que tinha – um dia – soprado velinhas coloridas de um bolo. Quando tinha sido. Amanhã? Semana passada? Dez anos atrás? Ontem? Ontem. Palavra engraçada: ontem. Ontem Miguel ria com todos os dentes. E me confessou: quando a lua ta cheia, ele uiva.

24 julho, 2008


Ela jura. Gosta de jurar. Quero estar perto não estando. Aparecer enquanto estou escondido. Ela jura que não é bem assim. Que a compreensão é turva. Quero não entender. Cortar o verso da fala. Monossilabicamente dizer sim e não na mesma frase. O ser que imagino metade é isso. Ela diz que tudo tem mais de um ângulo. Que o filme é bom no final. Ela jura. Ela cantarola uma canção. Jura que sua avó cantava isso perto de sua cama. Duvido dela. Da existência dessa avó. Ninguém sabe cantar. Eu não sei. Ela jura que meus erros são iguais. Eu, que não sei rir. Rio. Detesto repetir. Eu quero cometer erros novos. Abrindo as cartas sei: Tereza morreu. Chico caiu da moto. A polícia civil me deu um flagrante brabo. A vela da noite anterior queimou inteira. Ela jura que conserta tudo. Fecho a porta. Ficou tudo branco e preto.

23 julho, 2008


um conselho:
crie seu filho
jogue fora
o espelho.

Eu tenho o vento
E parte de mim é asa
Misto de beija flor e morcego
Não adianta esperar então
Existem coisas que se queimam
Na lareira
Vou levar a mala
Que tem um carnaval amarrado dentro.

15 julho, 2008


Três da manhã. Ela deve estar dormindo. Ela deve estar ligando pra minha mãe. Pra mãe dela. Ela deve estar assistindo o último filme da globo. Ela deve estar rasgando minhas camisas. Ela deve estar vasculhando minhas anotações. Ela deve estar arrumando as coisas dela pra ir embora. Ela... será que ela pegou uma faca da cozinha? Será que botou veneno no suco? Ela...
Três e quinze. Tenho que entrar. Chave sem barulho na fechadura. Sapatos tirados na perícia ninja das madrugadas. Pé ante pé. Um som estranho. Acima da música. Gemidos. Ela está com alguém. Não, é um filme. Ela está com alguém. Não, é a porra da música. Ela está...
Três e vinte. Porta do quarto só encostada. Abajur ligado. Penumbra. Vejo a bunda. Dela? De outra ela? De algum ele? O gemido é dela. É? Procuro pelo chão pistas que me digam o óbvio. Circulo devagar a cama. De olhos bem fechados. Ela balbucia palavras sem sentido. Pele arrepiada. Prazer. Muito prazer. Vou dos seus olhos pra sua boca. Entreaberta. Pele suada. Onde ta o cara? A mina? Peitos sacudindo. Mais um orgasmo. Procuro ver de onde emana tanto gozo.
Três e meia. Sua mão saciada solta seu amante. Olho com inveja pro cabo da escova de cabelo. Saio. Pé ante pé. Vou pra sala e ligo a tv. No vídeo ela deixa a pista, em batom vermelho: “enquanto você dorme, o mundo gira”.

13 julho, 2008


Curriculum vitae

livros que leu: quase tudo do G.G. marquez, quase tudo dos beats, quase tudo que me foi mandado na escola, quase tudo da poesia marginal anos 70, quase tudo do tudus de arnaldo antunes.

comida que não comeu: sushi e quase tudo que é comida metida a besta

pensamento lúcido: jamais amei roberto carlos

pensamento bêbado: a importância de não estar lúcido, é compreender quem não é lúcido nunca.

últimas ocupações: carteiro, poeta,vendedor de livros, artesão, mexer com cebola.

sonho de querubim: ser amigo de win wenders

noite ou dia: todas as noites e alguns dias

quais são as palavras: sim salabin

bêbados riem de quê: os bêbados riem deles mesmos, dos outros, de coisas e pessoas (não necessariamente nessa ordem). depois riem de novo, e vão rindo, até que deles só sobre isso: o som cristalino do riso.
O que é poesia: poesia me parece ser a tentativa de retratar o mundo em um 3 x 4 em terceira dimensão.

quem não é profeta: não são profetas os que profetizam. todos os outros são. os caras sentados em suas cadeiras na porta de casa, em uma pequena cidade do interior, são todos profetas: sabem quando vai chover, quando vai ser o batizado de maria, quem morreu e quem tá quase, e nem por isso se acham melhores. só são especiais pra quem os olha de longe.

O que é levar um susto saindo do val improviso: é pagar o sapo de ser pego no flagrante. é o beijo na garçonete. é o tapa no baseado. é a passada de mão na bunda da vizinha, bem de leve e com consentimento.

09 julho, 2008


SOLTO OS NÓS DOS SAPATOS E O LADRÃO ME ALIVIA. SOLIDÃO! ENTRE DUAS MIL PRETENSAS CRIATURAS HOMUSAPIENS. O VELHO FORD BIGODE URINA COMO UM VELHO. A CIDADE SOPRA VAPORES DE ESGOTOS E FOSSAS ANTI-SÉPTICAS. O MAU HÁLITO É CONSEQUÊNCIA DO MAU HUMOR. A PELE QUE DEGENERA COM O SOL DO MEIO DIA É SÓ UMA PÁGINA QUALQUER DE UM LIVRO INACABADO. NENHUM LIVRO ENSINA OS MANÍACOS ADOLESCENTES A CONTAR CARNEIRINHOS ANTES DE DORMIR. O ORIFÍCIO DO SOVACO DA COBRA É SÓ UMA PISTA DE CONTRA MÃO CONTRA FLUXO CONTRA FLEUMA DA ESQUISITA SONOLÊNCIA DA MARIJUANA STRIPTEASE. O SÍNDICO MORREU NO PALCO GENIAL E GRANDIOSO COMO POUCOS. QUEM SABE AO CERTO, SABE. QUEM NÃO, VAI TER DE DESISTIR. O LUAU DOS CARBONÁRIOS É SÓ UM REVIVAL DE PARANÓIA JUVENIL. NOSSA GUERRA SEMPRE ESTEVE PERDIDA. UM QUILO DO BOM É A PASSAGEM DA MÁGICA XAMÃ. O SÍNDICO SEMPRE SOUBE. NESSAS, NAS OUTRAS, O OLHO DA CASCAVEL, CLARO, É SEMPRE O PONTO FINAL DA ESTRADA. NA DÚVIDA DAS VIAS, CARIMBE TUDO. O QUE DE RESTO RESTE, É SÓ O GOSTO NA BOCA DA FALTA DE DENTES. TÉDIO. SAUDADE.

08 julho, 2008



Então tenha um bom dia
E, se tiver tempo, olhe pro céu
Bonito pra caralho hoje!!!!
Então fica tranqüilo
E enquanto espera o ônibus
Assovia uma canção da tua infância.
Então, dá uma risada pra nada
E ensaia uma dança em cima da poça de chuva
(provavelmente a última antes do verão)

06 julho, 2008


Cinco horas da tarde. O Sr. Samuel olhou com lentidão programada cada coisa espalhada pelo seu quarto. Coisas. Ele sabia que eram coisas. Ele sabia o nome de cada uma daquelas coisas. Sabia quando elas tinham vindo parar na sua mão, e porque. Olhou pra baixo de sua cama e sentiu – mais do que viu – seus chinelos. Velhos. Tudo naquele quarto era velho, ele sabia. Calçou as sandálias e foi até a janela. Levantou sem esforço o caixilho e mais uma vez se espantou. Todas as tardes ele cumpria o mesmo ritual: olhar suas coisas, calçar as sandálias, abrir a janela e olhar a rua. Sempre no mesmo horário. Sempre um novo espanto. De onde vinha tanta coisa nova, se no seu quarto o tempo teimava em não passar? O garoto filho da vizinha fazia piruetas em um skate colorido. Cinco meninas rodavam em uma ciranda sem som. O sol tingia as nuvens em vinte? Trinta? Sabe-se lá quantos matizes de cores diferentes. Um passarinho desconhecido cerzia um ninho na lâmpada queimada do poste da esquina. O Sr. samuel pensou se eram reais as imagens. Se aquilo tudo não era uma ilusão. Uma a mais. O novo, desde há muito, o entristecia mais do que o assustava. Pensou em gritar. – Maria! Ô mariiia! Não. Gritar para quê? Para quem? Sabia. Sentia. Maria não existia mais naquela casa. Tinha existido? As vezes se flagrava pensando que as pessoas que tinham morrido naquela casa nada mais eram do que personagens dos seus velhos livros lidos. Maria, madalena, aurora... maria, madalena, aurora...
- seu samuel! Seu samueel!
Pensou em não responder. Pensou em simplesmente abrir a janela e saltar. E se não morresse logo? E se ficasse completamente estropiado e “vivo”? – um momento! Um momento por favor.
- seu samuel, dona sebastiana mandou lhe avisar que o senhor esqueceu de novo de pagar o condomínio.
- esquecer? Eu não esqueço nada! Nunca! Diga a dona sebastiana que logo mais eu passo em sua residência e acerto tudo. É lógico que isso não passa de um problema documental da senhora sebastiana. Mas eu acertarei tudo. Acertarei tudo. Está me compreendendo?
O garoto que tinha dado o recado de há muito que tinha saído, mas o senhor samuel detestava ser interrompido. Tanto fazia se tinha ouvintes ou não, ele nunca deixava um raciocínio sem conclusão. Sem se achar completamente convencido. – essa dona sebastiana é uma criatura má e sem escrúpulos. Eu lhe disse – há muito pouco tempo – que eu não moro nessa coisa que ela chama de apartamento. Na realidade eu moro no passado. E ao que me conste, o passado não tem taxa de condomínio. Eu posso até dormir nesse ano da graça. Mas eu sempre acordo em meados dos anos quarenta. Eu sou um romântico. Eu sou uma partícula de uma jazz band que toca ininterruptamente uma música sem fim ou começo. Eu sou sam. O sam que o bogart diz: “toque de novo sam”.

05 julho, 2008


onde escondi meu girassol de vidro
onde escondi meu olho de potestade
onde escondi meu espelho de três faces
onde escondi o inseticida e o livro de baudelaire
onde escondi minhas coisas sem serventia
onde escondi meu playmobil colorido
onde escondi minha velha camiseta do ramones
acredito que perdi tudo...
...no dia que achar, me acho
Acho eu

04 julho, 2008



Ana se mistura com o sal
Água por todos os lados de ana
Ana ama o mar
O mar ama ana
Mar e ana
Mariana
Puro mar
Sem um porto seguro

26 junho, 2008


Anoitece na cidade dos impossíveis. A ponte presidente dutra é o retrato desses impossíveis: um caos. Cenário de blade runner com misturas hiper-realistas de um algum vanguardista europeu. Como disse, anoitece. A barca cruza devagar o velho chico. Indiferente a ponte. Indiferente aos replicantes que cruzam a pé, de barco, de moto, de bicicleta. Na primeira parada, fabinho diz: vamo vê o xamã! Instantes depois, já com a colômbia nas narinas e a loura gelada no coração seguimos viagem. E que viagem...

Acorda, levanta, resolve

Há uma guerra no nosso caminho

Nos confins do infinito

Nas veredas estreitas do universo

Vejo

As cinzas do tempo

O renascimento

As danças do fogo

Purificação, transporte

Escuto

O trovão que escapou

Lirinha se veste de louco. Parece um pouco com cada um dos que dançam esperando a chuva. Esperando a porrada certeira nos cornos. Luzes no palco. Escuridão. Um candeeiro, e o palco é uma tapera. Em cima da serra. Tem um pé de umbuzeiro na porta. Lá fora os lobos. Os lobos. Os bobos.

Antes do peito dos mouros Antes dos gritos da gente Antes até da saudade Que viajou além-mar Do banzo dos africanos Do toré no mato verde O fogo com seus estalos Fazia um som Já fazia um som Já fazia um som

Duas horas de catarse. De loucura. De gritar ao som dos tambores. De uma hora pra outra, acabou-se. Ruim sair assim. Como se o final não fosse aquele. Como se aqueles tambores nunca mais saíssem. Como se o som nunca mais parasse de explodir. De tocar. O xamã acende um candeeiro. Segura em sua mão de tremes e tremes. Canta. Recita. Eu bebo. Abro os braços. Louvo o santo louco dos loucos da terra dos impossíveis. Aí chove. E lava a mágoa de quem não queria que a noite acabasse. Mas ela sempre acaba. Como tudo. A noite sempre acaba... e chove...

Seu boiadeiro por aqui choveu

Seu boiadeiro por aqui choveu

Choveu que amarrotou

Foi tanta água que meu boi nadou