10 novembro, 2008


O domingo é um dia cruel. O sol bota as unhas. A mão inteira no chão. Acho que resolveu foder com tudo. Penso em me fechar no quarto. Me sentir camisa. Me pendurar em um cabide e dormir. Morrer. Tudo dentro do guarda roupa é morto. Opaco. Cheira a naftalina e lembrança. O sol. Vai embora quando? A noite vai chegar quente. Sem alma. Sem vento. Acendo o cigarro número quarenta e quatro. Solto a fumaça número noventa e nove. Na fumaça desenho uma nuvem. Uma chuva. Talvez uma chuva. A fumaça olhada. Dissecada. O cadáver de um vício companheiro da solidão em tecnicolor. Não quero olhar da janela. A janela não existe. A janela existe. E tem um mundo vasto demais visto pela janela. Sei da impossibilidade. Não olho pela janela. De certa forma sou um fugitivo. Um exilado do mundo. Fazendo parte, não faço. Não faço nada. Não nado. O sol. Trégua nenhuma. Nada de mão passando nas costas. Nada de carícias fraudulentas e de mão única. Sem rir. Sem falar. Ordem. Seu lugar. O sol. O termômetro enlouqueceu. Quarenta e cinco. Meu personagem esqueceu a fala. A deixa. O ponto. Meu personagem não sabe que perdeu. Ou o que perdeu. Não estou bem certo do que digo. Não quero ser roupa. Quero ser a colcha jogada de qualquer jeito sobre a cama largada no quarto de qualquer jeito. O sol. Puta que o pariu. O sol. Penso nu. Penso em sair nu. Impraticável. Onde colocar cigarros, celular, carteira, moedas, amuletos, patuás, flagrantes? Falar pouco. Falar nada. Seduzir pelo silêncio. Tornar o silêncio tão denso que incomode os ouvidos. Café. Traz café frio. Gelado. Uma cerveja. Duas. Um monte. Gastar pouca energia. Levantar o braço devagar. Coçar os ovos. Passar o cigarro pra outra mão. Coçar o sovaco. Uma punheta talvez? Impraticável. Calor retado. O sol. O suor pegajoso. Um nojo sereno de mim. Da humanidade. Da água morna. Gritar. Gritar não. Gasta muita energia. Não quero mais palavras. Uma de três letras está me matando. Com mais lentidão. Como se tortura fosse. O sol. Sol. Sol. Puta que pariu.

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