28 julho, 2009


Prato do dia:
Porradas ao molho de terça
Acorde cedo. Facilita. Abra os olhos, olhe pros pés, pras mãos e levante. Tem sempre alguma coisa pra fazer antes que você possa saber bem o que ta acontecendo. Então? Sentiu? É só um gostinho da porrada que vai alimentar o dia, o dial, o dedo duro. O espelho do banheiro não está louco. Nada de drogas de manhã – por favor. É você sim. Olhou pros dentes? Estão necessariamente limpos? Saia. Tem alguém do lado de fora esperando a vez. Ou você acha que tem todo o tempo do mundo? Roupa no ponto. Sapatos? Sandálias? Prossiga, sem elucubrações, por favor. Tem uma filha dizendo que está faltando alguma coisa pra ela. A outra também sabe que tinha que dizer alguma coisa, mas esqueceu. Depois diz. Vem porrada, pode acreditar. Se ligou no relógio? Então meu camarada. Caia fora. Puta que pariu! Esqueceu de tomar o remédio? Dançou compadre. O estômago vai tocar um hardcore detonado. E então vento no rosto. A pequena motoneta anda a sessenta na estrada fodida. Reza cara. Reza. Senão o carro em frente freia de vez e tu ta na merda. Reza. Senão o escroto do caminhoneiro cheio de arrebite te usa como rampa. Porrada feia meu irmão. Anda. Rápido. Tem de carregar primeiro o que vai pra mais longe. Se liga na peãozada. Tem dois malocados no banheiro. Maconha na certa, ou crack. Porrada no quengo. Vambora caralho! Se ligou na hora? O telefone ta tocando. O cara não veio. O cara não pagou. O cara diz que a mercadoria não chegou. E você? Lendo um livro? E você recebe salário pra ler? Levanta porra. Olha a porrada. Olha o jacaré de olho na tua bunda. Olha o relógio. Cadê a porra das cordas? E as cantoneiras? Desligue o som dos ouvidos porra! Tem alguém gritando o teu nome. Não resmungue. Preste atenção. Olhe pra frente. Se ligou no relógio? Vontade de cheirar uma né? Nem tente. Vão notar. Toma um arrebite. Dois. Bebe um conhaque. Acorda cara! Viu o relógio? Desliga a máquina. Presta atenção, deixaram as luzes acesas. Então? Vai lá, apaga. Porrada meu nêgo, porrada. Suba na motoneta, lembra de levar a encomenda. Chegou? Bom, tuas filhas aprontaram. Tem de ser mais rígido. Mas nem tanto. Tem de falar com calma, mas nem tanto. Misture. Engula. Melhor não deitar. E o remédio do estômago, tomou? Agora não adianta né? Pelo menos deita. A porrada vai continuar. Quinze pras duas seu otário! Vai perder a hora. Vai perder o bonde da história. Vai perder a vida se não ficar ligado no sinal. Desliga os pensamentos. Vontade de escutar uma música? Vontade de conversar fiado? Vontade de viajar só de ida? Cala a boca. Cola a boca. Sem rir sem falar sem rir sem falar. Faltaram dois peões? Te vira. O serviço não faltou. Então? Ta esperando o que? Se liga no caminhão que chegou. Vai pro rio. É carga de horário. Puta que pariu! Choveu? O caminhão quebrou? A fiscalização embaçou? Te vira malandro! Pra que tem internet nessa merda? Faz contato. Resolve. Se vira. Olha a hora. Uma briga no meio da máquina. Se mete. Interfere. Resolve. Babão! Filho da puta! Ladrão! E o caminhão? Ta carregando? Ratos de porão, só um refrão na cabeça. Esqueça. Fume um. Mais um. Mais um. Olha a hora. Sentado? Isso é que é vida. Piada de patrão é ordem sinistra. Então meu amor, levante. Quem ta preocupado com o que você pensa? Ou quer? Olha a hora. Carregou tudo? Fez tudo? Deu certo? Nada de mais. É teu papel fazer dar certo. Queria o quê? Um elogio? Faz-me rir! Faz-me rir. Noite já? Noite já. Nunca há tempo. Viu o por do sol? Que sol? Roubaram a máquina fotográfica? Dane-se. Ria de si mesmo. Faça uma piada, agora pode. Mas não exagere. Senão vomita. Porrada sempre, vossa excelência. Lar doce lar? Um caralho! Então? Pagou água? Luz? Plano de saúde das filhas? Tomou o remédio? Você fuma demais. Vai morrer de câncer. Porrada por dentro seu acéfalo de merda. Então? Preparado? Aqueça o dia em mágoa materna. Escute. Olhe pros lados. Acenda o cigarro. Mexa um pouco, senão engrossa. Fale, mesmo sabendo que não está sendo escutado. Um pouco mais de mágoa? Coisas do arco da velha então. Sem abstrações, por favor. Elas engrossam o caldo, fica ruim de engolir. Já tinha botado as abstrações? Tempere um pouco com sonhos na realizados. Com viagens nunca feitas. Com projetos engavetados. Mais um pouco de mágoa matriarcal. Forte. Vigorosa. Acenda mais um. Suspiros? Que bobagem. Você não é Ginsberg seu fodido. Ta pronto. Engula e corra pro banheiro. Olha no espelho. Treina um sorriso. Sai. Senta. Espera. Amanhã? Qual o cardápio? Você é incorrigível meu caro. Nesse bistrô onde você é sócio, o prato é sempre o mesmo.

Um comentário:

Alexandre Heberte disse...

Independente do menú, mesa posta; dentes afiados e lingua ágil.