28 março, 2009


Escuto os passos apressados do pai. O cara. Que come que manda que fode que berra que determina que concede ou não. Mamãe me acuda. Mamãe me ouça. Mamãe me conte o final da novela. Mamãe me ensine a pregar um botão de camisa. Mamãe faça uma oração pros meus. Ora pro nobis. Quero aprender. Quero um espelho. Quero beber um pouco mais de água antes de dormir. Encha meu saco. Ou não. Olha pra mim. Ou não. come meu fígado sem tocar nele. Desliga a porra da televisão. Vai estudar. Me dê a benção. Porra. Não corra. Então faz de conta que sim. Vem pra casa. Minha casa? Quem tem casa? Festa de corpo nu. Festa de não querer voltar pra casa. Quem tem casa? Festa de lombra nua. Quem tem casa? Coração que bate lata na esquina. Um dia perguntei a um amigo: quer trocar de família? Eu prefiro morrer. Ele disse.

17 março, 2009


Existe sim uma ilusão de ser feliz. Mas não sei quem sabe fazer isso a ponto de ensinar. Olho pra trás e vejo o menino com o copo de danone cheio de cola. Depois ri. Rio também. Acho que ele não me vê. Acho que não o vejo se olhar direito. Tenho um relógio no pulso. Isso significa que tenho horários a cumprir. Metas. Subo as escadas apressado. Por um instante me deu vontade de descalçar os sapatos. Sentar do lado do menino. Cheirar um pouco de cola também. Rir. Assim como se rir fosse a coisa mais importante a se fazer nesse dia de sol tão absolutamente filho da puta.

14 março, 2009


dona cecília,
tudo bom?
o papo é curto. tipo: recado.
eu, sou alegre umas vezes
na maioria delas, sou triste
logo,
não sou poeta.
esse é o motivo.

06 março, 2009


Um ovo quebrado.
Tempo passado em que a vida saiu.
Foi embora.
Passear como quem não quer nada
agora.
Ou quer um monte depois.
Daqui a um tempo.
Pedaços deixados pra trás.
A ave não volta pra ver o ovo.
quebrado.
passado.
A ave é o novo.
ovo.

Esqueço
A jura
De não
esquecer

Poste mijado
na esquina.
Copo derramando
em câmara lenta.
Espaço vago nos claros
olhos da gorda botero.
Fogo a lenha cozinhando a
semana cheia de
números ímpares.

02 março, 2009


A língua viaja. Medo de nem voltar. O bico do peito dela. Duro. Caminho devagar. Perdido. Achando que acho o caminho. Quem acha a porra de um caminho sem placas? A vida não diz: vá. Não diz: venha. A vida? É uma putinha, bonitinha, que sempre mostra mais do que dá. Procuro o dinheiro no bolso. O bico do peito. A campainha lá fora, isso lá é hora? o peito. O bico. O umbigo lá embaixo. A caverna. O jornal nacional sem nação. Sem noção alguma. Quero mar. Cadê mar. Agora é hora de sonhar com rede. De olhar a árvore frondosa do outro lado da pista. O peito. O bico. Viajo de novo. Hoje estou assim. Explícito. Não vou escrever nenhum epitáfio. O bico. O peito. Depois, só depois, o umbigo.

01 março, 2009


A cabeça manda. E o vento sopra na rua vazia. O céu da boca dela não tem estrelas, mas quem se importa. O mestre falou que o vento é de verdade, e que tem cor. Abre o livro de poesia, página setenta. Tanto faz o poeta. Lá, na terceira linha tem uma mensagem. Siga a mensagem. Saia fora de dentro de você e quebre a vidraça azul da sua janela do sonho. A dor? Que dor? A dor não combina com a chuva. Não combina com a luva na mão da princesa isabel. Eu imagino. Esse é meu pecado. Minha sina minha maldição. E quem disse que isso pode ser ruim. Fora de mim é caminho. É um lugar que não conheço. Não conheço também dentro de mim.