26 novembro, 2007


[exterior, noite] voz em off: - viver? É muito perigoso... [pausa] voz cansada: - tudo...pode...acontecer... [farolete da polícia iluminando um beco]. Cena 1. um homem nu, absolutamente magro, come a bunda de uma mulher de plástico. O policial ilumina a cena com o farolete e grita: - oh shit!!! O outro policial aponta a magnum 45 para o peito do esquelético tarado e fala entre dentes: - welcome to hell fela da gaita. [corte – a cena congela – um senhor distinto, vestindo roupas do princípio do século aparece e traduz as falas dos policiais] (pigarro) – boa noite senhoras, senhores. O objetivo dessa minha singela aparição é deixar um pouco mais claro o linguajar desses policiais, e, se possível, transformar essa película em algo proveitoso. (pigarro) – o magro comendo a mulher de plástico, apesar de nada acrescentar, mostra como são solitários os corretores da bolsa. Vale como performance, algo assim meio zé celso. O primeiro policial, ao vê-lo, exclama: - oh merda. O outro, que saca a arma, com um linguajar misturado de inglês e ceares, vocifera: - bem vindo ao inferno, filho de um instrumento musical. Como se vê, são hilários. Bom, mas o que eu queria realmente dizer com isso é que...[corte – o policial com a arma na mão descongela e dá dois tiros no peito do comentarista – (tihuana canta tropa de elite osso duro de roer)] – os idiotas falam demais! Aliás, falando nisso, e aproveitando que está gravando, eu... ta gravando? Bom é que eu queria mandar um beijo pra minha filha que ta aniversariando, e dizer que nunca mais eu chuto a boca dela com coturno, e...[o outro policial descongela, atira no magro, na mulher de plástico, no companheiro, no farolete do carro, na fachada de néon que ilumina a cena, no diretor, no câmera e na claquete] após soprar o cano da arma fumegante, ele exclama: - my name is silva! João da silva! Ao longe se ouve uma pacata música dos ratos de porão: “de pé contra o muro, de pé contra a lei. Pra ser condenado, pra ser fuzilado, não há esperança pra eu ou você”.

22 novembro, 2007


BENDITA TÚ
QUE INFLAMA AS ÁRVORES
SOPRA MAIS QUE O VENTO
E JOGA PALAVRAS DE LAVA NO VENTILADOR
DO TEMPO.
BENDITA TÚ
QUE YEM VENENO E ANTÍDOTO
NOS BICOS TÚRGIDOS DOS SEIOS.
BENDITA TÚ, QUE COMEÇA TODAS AS REVOLTAS
E AS APLACA, ACALMA, TRANQUILIZA.
SENHORA VENDAVAL E CHAMA
QUE TRAZ NOS LÁBIOS CANÇÕES DE
RENDIÇÃO E VITÓRIA
BENDITA TÚ
CUSPINDO NAS BANDEIRAS
PAIRANDO ALTANEIRA ACIMA DE TUDO E TODOS
NOTA DEZ
NO QUESITO ALEGORIA
E VIDA.

Abro a porta.
O coração amotinado
Ergue a cabeça, sai,
Sem cautela alguma
Como se inexpugnável fosse.
2
Notícias da alemanha:
A carne enlouquece
Vacas e galinhas tremem de medo
Croatas tremem
De medo e frio
Parados no semáforo.
3
O branco quadro negro
Não anima.
Amigos em nome
Afogados no nada
No silêncio do nada.
A camareira para na soleira
Solta o balde, o rodo, o pano sujo
Horrorizada.

21 novembro, 2007




18 de janeiro. Lembro do dia porque era o aniversário de giletinha. Porque giletinha? Porque mesmo dizendo que era homem, sempre que ficava sozinho com um da gente ele queria dar o cú. Nós estávamos brincando de empinar papagaio quando os tratores chegaram. Pararam bem em cima do campinho de futebol. Enrolamos as linhas, as pipas, e corremos pra lá. Que novidade era aquela? Um monte de homens com capacetes brancos, e um monte de tratores com nomes esquisitos: “caterpillar”.

- moço, o que é catrepilha?
- é o nome do priquito de sua mãe! Sai fora monte de catrepilha!!!

O som das risadas marcou o nome da turma. Viramos as “catrepilhas”. Nos acostumamos a andar por lá. De vez em quando roubávamos alguma coisa dos operários, de vez em quando algum deles comia o giletinha. Somos parte importante daquela construção. Ousaria dizer, que cada um de nós é um dos tijolos daquele velho prédio amarelo. “condomínio borba gato”. As “catrepilhas” do borba gato. Eles roubaram nosso campo de futebol, e nos deram uma história.

20 novembro, 2007


Na narinária corredor da ventania corre branca e célere a dama branca do xadrez que diz: um dia é tu! Vates cantando músicas inaudíveis. Atonal. World music atonal. Cabelinho riria. Mas cabelinho é irreal. Como todas as minhas memórias editáveis ou não. Saudade de beber ayahuasca. De me sentir mais bicho que gente. Abrir todas as moléculas e dizer sim! Onde os comprimidos de não pensar? Pink floyd em um cd perdido. Perdidos... perdidos no space. Cadê a porra daquele robô que dizia “perigo, perigo!!!”..................................assisto de novo novamente matrix. Jonhy mnemomic. Ciberpunks tão reais em suas cúpulas geodésicas de terror futural. Quero comer com coentro. Chorar. Ficar puto porque tem gente escrota que ameaça crianças, que ameaça músicos, que ameaça a vida. Não gosto do gosto do anonimato. Por isso faço tantas trapalhadas: tentativa “real” de ser reconhecido, e nunca, em hipótese nenhuma, anônimo. Cago pra audiência. Escuto cazuza na multidão. Diferente. Eller. Vontade de rir sozinho. Pequenininho. Meio tarântula dylanesca. Porque fazer sentido? Pra quem? Gosto de foder com minha namorada. Gosto do cheiro estranho e terno da sua boceta. Gosto de olhar o dia de manhã, quando a lombra ta serenando. Sol. Nuvens. Céu azul de doer. Caralho! Hoje é dia de se fazer coisas diferentes, ou não? Estou com o espírito de matar hotentotes. Saudade de guga cabeção, de sidney, de mim quando tinha dezoito anos. Eu quero.
Quero.
E tem gente bem te vi.

02 novembro, 2007


Por quem os sinos dobram

Fico pensando nos meus mortos enquanto cazuza verbaliza meus sentimentos: “meus heróis morreram de overdose...” engraçado pensar no finito. No que se acaba. Na árvore que tomba sob o seu próprio peso incomensurável. Penso nos vivos que quero mortos. E nos meus mortos – tão vivos – debatendo comigo nos corredores mal iluminados do borba gato. Sebastiana me empresta comprimidos para dor de cabeça, me convida para acender velas, incensos, escutar músicas de maysa. Silencio. Gal costa “esqueçam os mortos, que eles não levantam mais”. Ela e bob dylan e caetano estão errados. Os mortos estão de pé. Cantando. Recitando poemas de amor e vida. Quero não pensar, mas não consigo. Minha vó está ali, sentada em sua cadeira de balanço, fazendo um crochê interminável. É real? É um filme de bunuel? Meu pai vem entrando agora, com uma pasta preta em cada mão. – pixote! Tudo bom? Eu? Tava no maranhão. – minha tia acabou de colocar seus óculos escuros, contar uma piada e perguntar: - será que ainda tem alguma cerveja na geladeira? Normando para o carro em frente ao bar de silvany, calças jeans surradísimas, um chapéu preto. Seu sax repousa no banco traseiro do carro. “esqueçam os mortos...” mortos não são feitos para se esquecer. São feitos para se lembrar. São para pontear nossa história. Ou pelo menos, a minha história. Meu mortos. Meu baú de brinquedos anti-matéria. Todos eles moradores do meu edifício, editando, contando e recriando a história da carochinha onde não existe final.